quinta-feira, 17 de março de 2016

Esclarecendo alguns Pontos

Olá,

Fico feliz em ver uma movimentação maior no blog após o último post. Inclusive, vendo alguns pesquisas que eu fiz para escrever o último post, percebo que a centelha de lucidez já existia antes na sociedade. Existem diversos artigos online comentando sobre a generalização do termo pedofilia e o seu mau uso para descrever crimes que acontecem contra crianças e adolescentes. Isto me deixa mais esperançoso para que um dia seja possível desmitificar essa condição que aflige diversas pessoas.


Dando continuidade a essa distorção de concepção e entendimento da palavra pedofilia encontrei um artigo muito interessante escrito por duas pessoas chamadas Gesânia da Silva Pereira e Vânia Maria Bemfica Guimarães Pinto Coelho para a Faculdade de Direito de Varginha.

Neste artigo são abordados, em um pouco mais de detalhes, vários itens que eu abordei inicialmente no post anterior. Aquele post tinha o intuito de ser um abre-alas para a discussão de pedofilia de uma maneira séria e sem preconceito. Acho válido agora começarmos a discutir vários dos aspectos envolvendo a doença e a visão que a sociedade tem sobre a mesma. Espero escrever diversos artigos a partir de agora discutindo essas questões de um ponto de vista emocional, racional e se possível jurídico também.  

Neste espírito, segue abaixo alguns pontos interessantes sobre o artigo mencionado os quais eu gostaria de comentar. Recomendo a leitura do artigo antes para que se entendo o contexto geral do mesmo antes de ler os meus comentários.

"O que se conhece como pedofilia nada mais é do que uma das doenças que faz parte do conjunto de parafilias relacionadas à idade, as denominadas cronofilias. Assim como a nepiofilia, a hebefilia, a efebofilia, a teleiofilia e a gerentofilia."

Ponto muito interessante e válido. A pedofilia é uma parafilia assim como várias outras mais obscuras ou menos conhecidas. Um dos exemplos mais interessantes é a teleiofilia. Este termo indica a atração por adultos sentida por pessoas menores de idade. Ou seja, um adolescente que possui uma atração por alguém mais velho (um ator, uma atriz por exemplo) é um teleiófilo. Claro, não pensamos nisso desta maneira e nem que isso seja uma parafilia entretanto é classificado como tal de um ponto de vista médico. Logo, o ponto feito aqui é de que a pedofilia pertence a uma classe de parafilias (cromofilias) relacionadas à idade. Pode ser uma das mais polêmicas mas ainda sim uma parafilia.

"A pedofilia pode também ser definida como sendo simultaneamente uma doença, um distúrbio e um desvio sexual, de acordo com a OMS (Organização Mundial de Saúde)"

Este ponto é muito interessante. No caso a OMS atribui três classificações para uma mesma 'coisa' de maneira a reforçar o caráter da doença em si. Vale notar que o DSM possui algo similar mas lida com a questão de uma maneira um pouco diferente e veremos em seguida sobre isso. De qualquer maneira, o primeiro ponto aqui é que a pedofilia é considerada uma doença. Logo, não é algo escolhido e sim algo inerente à pessoa que a tem. 

É considerado um distúrbio porque a doença traz uma série de sofrimentos/comprometimentos mentais à pessoa que possui a doença. Ou seja, ter essa doença afeta a pessoa em termos mentais (já que se trata de uma doença mental) como depressão, ansiedade, baixa auto estima, paranoia e outros. Com isso a OMS reconhece que uma pessoa que possui a doença denominada Pedofilia sofre com isso e de uma maneira severa o suficiente para ser considerada um distúrbio. 

A última parte, a classificação de desvio sexual, é a mais simples de se entender. Claro, a sexualidade humana é muito ampla e podem haver diversas expressões da mesma. Lembrando, por exemplo, que a homossexualidade não era reconhecida como uma forma válida da sexualidade humana até pouco tempo atrás. Obviamente que isso significa que à medida que a sociedade evolui também se revisa o que é aceitável em termos de comportamento sexual. Que fique claro que isso não quer dizer que relações sexuais com crianças e adolescentes é aceitável ou que isso deveria ser aceitável num futuro (perto ou distante). 

A partir do momento que o foco da atração sexual gira em torno de crianças e adolescentes temos que reconhecer de maneira clara que atos sexuais com os mesmos gera danos físicos, mentais e emocionais para os mesmos. Por esta razão não é aceitável, sob nenhuma hipótese, que tais coisas aconteçam logo a classificação de desvio sexual para a pedofilia. Isto não torna a pessoa que sofre desta doença em um monstro mas sim reconhece que infelizmente o foco do seu desejo sexual não é alcançável nunca e que medidas (terapia, remédios, suporte) devem ser tomadas para evitar que algo aconteça ou venha à acontecer. 

Em relação ao DSM ele possui três níveis relacionados à pedofilia e não três classificações automáticas para a mesma conforme a OMS. Neste caso o primeiro nível é qualquer atração sexual por crianças pré-púberes que são no mínimo 5 anos mais novas que a pessoa sendo diagnosticada. O segundo nível é para pessoas que sentem atração sexual por crianças maior ou igual à aquela sentida por adultos. O terceiro nível é quando a atração sexual (em qualquer um dos níveis anteriores) geram sofrimentos/comprometimentos para a pessoa ou se a pessoa, infelizmente, agiu em relação a sua atração sexual.

A principal diferença aqui é que o DSM-V reconhece, oficialmente, que uma pessoa possa sofre de pedofilia e sentir atrações sexuais por crianças sem que isso afete sua vida diretamente. Ou seja, existe a possibilidade de pessoas sentirem uma atração secundária por crianças enquanto conseguem namorar e se relacionar com adultos. Nestes casos, é possível que a sua pedofilia não gere angústia ou sofrimento. Claro, existem também pessoas que somente sente atração por crianças e isso pode gerar um grau elevado de stress, depressão, angústia, ansiedade para esta pessoa e isso a levaria a ter um distúrbio pedofílico. O mesmo é verdade caso a pessoa tenha agido em relação a essa atração sexual. Logo, temos um pouco mais de liberdade para a classificação de alguém que sofra com a doença e não somente uma categoria. 

"A existência desta se dá através da atração sexual por parte de um adulto para com uma criança, o simples desejo, independente da realização do ato sexual propriamente dito já estará caracterizando a pedofilia, não sendo necessário, portanto que ocorram relações sexuais para que ela se consume"

Aqui temos uma outra definição interessante e importante. Pedófilo(a) são aqueles que possuem um desejo sexual direcionada à crianças. O mesmo é válido para hebéfilos. A atração sexual em si, ou melhor dizendo a sua existência, é um dos critérios para se dizer que a pessoa sofre de pedofilia. O DSM-V prevê alguns critérios para determinar se uma pessoa é pedófila ou não:

  • Ocorrência de forma recorrente, por um período de pelo menos 6 meses, de fantasias sexuais intensas e/ou desejos sexuais e/ou comportamentos envolvendo atividades sexuais com crianças (pré-púberes ou abaixo dos 13 anos).
  • O indivíduo agiu em relação a essa atração sexual ou essa atração sexual/fantasia causam problemas profundos ou geram dificuldades de relacionamento interpessoal (usado para diagnosticar distúrbio pedofílico.)  
  • O indivíduo possui pelo menos 16 anos e é pelo menos 5 anos mais velho que a criança definida no primeiro critério (com idade igual ou menor a 13 anos). 
Importante ressaltar que em relação ao último item, o DSM adiciona uma nota especificando que pessoas no fim da adolescência tendo relações sexuais com alguém de 12 ou 13 anos deve ser desconsiderados de um diagnóstico de pedofilia.

"Atente-se para o fato de que um verdadeiro pedófilo pode nunca haver praticado um crime sexual contra uma criança ou adolescente, bem como alguém que não seja pedófilo pode havê-lo praticado diversas vezes

Perfeito o comentário neste ponto. Conforme já discutido no post anterior nem todos as pessoas presas por abuso de crianças são pedófilas (sendo que a maior parte não é) e nem todos os pedófilos abusam ou irão abusar de crianças (a maior parte não o faz). 

"Há que se ressaltar que não existe na Legislação brasileira nenhum crime intitulado 'pedofilia'. O que realmente acontece é uma adoção equivocada dos termos utilizados erroneamente pela mídia televisiva e escrita para tipificar uma espécie de crime contra crianças"

"Fala-se em pedofilia como crime praticado por um pedófilo apenas e tão somente pela assimilação do termo através do que é passado pela imprensa"

Dois pontos importantes. Um, não existe um crime chamado pedofilia no código penal brasileiro. Não existe como uma pessoa ser acusada de um crime que não existe no código penal brasileiro e muito menos ser processada e condenada por isso. Dois, elas denotam como existe uma má apropriação do termo pela mídia que faz mau uso da palavra e do conceito e a aplica em situações onde a mesma não cabe. 

"Saliente-se que o que pode ser considerado crime são as consequências provindas do comportamento de um pedófilo, ou até mesmo qualquer outra pessoa que venha a praticar ato imoral e abusivo contra crianças e adolescentes, que firam a lei penal"

Novamente, reforçando a ideia de que pedofilia não é um crime por si só. Quando a pessoa que sofre de pedofilia age com base em sua doença e realiza um ato sexual com uma criança isso se torna um crime. Este é um ponto fundamental de entendimento. Não devemos demonizar pessoas que sofram de uma doença à qual não tem cura e que não foi escolhida por tal pessoa. Entretanto, também não devemos aceitar que algo imoral seja feito devido a essa doença e se a pessoa faz algo errado com base nisso ela deve ser punida. Entretanto, ressalto que somente a punição não serve de nada. Esta pessoa necessita de ajuda (terapia, remédios, suporte) para evitar que cometa um novo crime e machuque outra criança. 

Outro ponto importante a ser percebido aqui é que mesmo pessoas não afetadas pela pedofilia podem vir a cometer crimes contra uma criança. Mesmo crimes de natureza sexual. Logo, novamente é necessário reforçar o conceito de que nem todas as pessoas que abusaram de crianças são pedófilas. 

Após mencionar os diversos crimes que podem ser realizados contra uma criança e/ou um adolescente as autoras mencionam o seguinte:

"Ressalte-se que os eventuais autores não são mencionados como pedófilos

Logo, reconhecem de um ponto de vista jurídico de que alguém que comete um crime contra uma criança não é classificado como um pedófilo. Isto não quer dizer que um pedófilo não cometa crimes contra crianças mas elucida o ponto de que legalmente falando não se é utilizado o termo pedófilo. Este termo é médico relacionado à uma doença mental. A mídia, e por consequência a população geral, faz mau uso do termo aumento assim o estigma e preconceito contra a doença e impossibilitando as pessoas que sofrem disto de buscarem ajuda. 

Convido-os para uma auto análise. Imaginem que alguém próximo de você (família ou trabalho) espalhe o rumor de que você é um pedófilo. Tente imaginar qual seria a reação das pessoas em relação a isso com base na sua própria reação caso você ouvisse esse rumor sobre uma outra pessoa que você conhece. Analise quais são os seus pensamentos e sentimentos em relação à um pedófilo e perceba como eles são fortes, ofensivos, carregados de escárnio. Estas reações são as que previnem um pedófilo de contar para alguém próximo que tem um problema e de buscar ajuda por acreditar que todos irão agir da mesma maneira. 

Por final espero que no mínimo a parte da conclusão seja lida do artigo mencionado onde todos estes postos levantados são resumidos e explicados. Também pelo fato de que deixa claro que sob nenhuma forma o abuso infantil (qualquer tipo de abuso contra uma criança - seja físico, emocional ou sexual) é aceitável e/ou permitido. Crianças e adolescentes são mais vulneráveis à abusos de qualquer tipo e é uma responsabilidade de qualquer cidadão de ajudar os mesmos caso eles estejam em uma situação de perigo. 

No caso específico de abuso sexual temos que considerar que existem pessoas que possuem uma sexualidade afetada por uma doença mental que os leva a ter desejos/atrações sexuais por crianças. Isso em si só não é crime e não é deplorável ou condenável. Estas pessoas necessitam de ajuda médica e terapêutica para que seja possível garantir que nunca venham a ocasionar um dano a uma criança. Temos que ter a menta aberta para isso e entender que ao ajudar estas pessoas de uma maneira humana também estamos prevenindo que crianças e adolescentes sejam machucados.

 

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