segunda-feira, 8 de agosto de 2016

Sobre suicídio

Eu escrevi em um post anterior Sobre Depressão. Mencionei que, às vezes, quando estou deprimido a idéia de cometer suicídio começa a fazer sentido logicamente. Claro que, quando não estou afetado pela depressão, esta ideia não possui nenhum mérito. Mesmo assim gostaria de falar um pouco sobre o suicídio.


Como você está?

Nós somos o oitavo país do mundo em que mais se comete suicídio. Mais triste é perceber que nos últimos 25 anos houve um aumento de 30% de casos de suicídio entre jovens. São muitas pessoas que infelizmente acabam tomando essa decisão todos os dias. Em 2010 as estimativas indicavam 24 suicídios por dia ocorrendo no Brasil, na sua maioridade em regiões mais desenvolvidas economicamente.


Me pergunto se temos hoje maneiras pelas quais podemos prevenir isto. De ajudar as pessoas que decidem por este caminho. Se poderíamos ter tentando pelo menos ajudá-las a não tirarem suas próprias vidas. Dito isso também reparo como conversar sobre suicídio é complicado. Ao informar meus pais que eu estava mentalmente instável e que pensava no suicídio eu fui suportado por eles. Mesmo que talvez não da melhor maneira.

Eles constantemente faziam "rondas" pelo meu quarto e não me deixavam sozinho a nenhum instante. Apesar de extremas acho válida a reação deles como pais, mas em nenhum momento eles se ofereceram para conversar comigo e tentar entender o porquê da minha tendência suicida e como eles poderiam ajudar.

Para a OMS, o tabu em torno deste tipo de morte impede que famílias e governos abordem a questão abertamente e de forma eficaz. “Aumentar a conscientização e quebrar o tabu é uma das chaves para alguns países progredirem na luta contra esse tipo de morte”, diz o relatório. Fonte: http://g1.globo.com/ciencia-e-saude/noticia/2014/09/brasil-e-o-8-pais-com-mais-suicidios-no-mundo-aponta-relatorio-da-oms.html
Concordo totalmente com o relatório mencionado na reportagem. Se ao menos existisse menos tabu e estigma relacionado a este problema mais pessoas poderiam ser ajudadas. Meus pais poderiam se sentir mais confortáveis em tentar me ajudar (não duvido da intenção deles em querer ajuda mas percebo que eles se sentem perdidos em como proceder na situação). O mesmo é válido para tantas outras pessoas e especialmente adolescentes. Já é complicado nesta faixa etária conversar com adultos, sejam eles quem forem, e isto se torna ainda mais complicado quando é um assunto delicado e complexo como este.

Vamos falar sobre suicídio

Por quê tentamos/cometemos suicídio?

Conforme mencionei no post Sobre Depressão eu tentei cometer suicídio quando tinha 15 anos de idade. Naquela época eu finalmente entendi o que era a minha sexualidade e como a sociedade tinha uma visão negativa sobre ela. Isto me levou a pensar negativamente sobre mim mesmo e, alguns meses depois da minha descoberta, eu tentei me matar.

Eventualmente eu cheguei ao ponto de que eu não conseguia mais lidar com tudo isso, eu precisava me matar.

Eu consegui com um amigo de colégio algumas pílulas e fiz o cálculo de quantas eu deveria tomar para me matar. Ao invés de calcular a quantidade com base na porcentagem de um dos princípios ativos eu usei a dose de cada cápsula. Logo tomei uma quantidade significativamente menor que a necessária. Passei mal e vomitei por horas e sentia dor no estômago por dias.

Ao longo dos anos eu nunca revisitei essa parte do meu passado. Nunca pensei sobre o por quê de ter tentado cometer suicídio. O que me levou por esse caminho ao invés de pedir ajuda. De tentar conversar com alguém sobre como eu me sentia antes que eu tentasse algo tão drástico.

 Descobri que grande parte disso era a vergonha que eu sentia de mim mesmo. Assim como do ódio pessoal que eu tinha por mim mesmo. Do nojo que eu sentia por ser como eu era e a noção de que tudo isso era algo muito ruim, baseado nas opiniões que eu lia online sobre outras pessoas como eu. Tudo isto me levou a uma depressão muito funda.

Eu sentia uma dor incrível, um desespero enorme e uma avassaladora falta de esperança em relação ao meu futuro. Eu acreditei em tudo que eu li sobre pessoas como eu. Eu deixei que estas coisas definissem como eu me via e esta visão era muito ruim. Eventualmente eu cheguei ao ponto de que eu não conseguia mais lidar com tudo isso, eu precisava me matar.

Muitas pessoas realmente não querem se matar. Elas não tomam uma decisão totalmente consciente sobre isto. Elas simplesmente são tão assoladas pela dor, desperança, desespero e depressão pelas quais estão passando que tudo isso supera a sua capacidade de gerenciar estes sentimentos.

Nós somos todos humanos e todos temos limites. Ninguém é uma pessoa ruim ou fraca ou doente ou louca por querer se matar. Você somente é uma pessoa que está sobrecarregada neste momento e que, infelizmente, acaba tendo uma visão pessimista sobre o mundo. Esta visão acaba fazendo com que o suicídio seja uma opção válida, mesmo que se logicamente isso não se sustente.

Esta distorção cognitiva é o que eu sinto de vez em quando. Quando estou em uma fase depressiva muito grande, e não sinto que existe um futuro para mim, toda a minha visão do mundo se distorce. Neste momento me parece que morrer seria a melhor solução para tudo.

Nestas horas eu preciso ter calma e respirar. Eu preciso dizer a mim mesmo que em mais alguns dias tudo passará. Que se eu conseguir sobreviver mais alguns dias as coisas não vão parecer tão ruins e que existe uma saída. Nem sempre isto é fácil no entanto.

Por esta razão eu consigo entender as pessoas que cometeram, ou tentaram, suicídio. Assim como eu entendo as pessoas que nunca chegaram a este ponto criticando pessoas que tentam o suicídio. A verdade é, no entanto, que a maior parte das pessoas não está apta a ajudar, e suportar, alguém que esteja suicida. Porque para estas pessoas esse pensamento nunca fez sentido. Nós como seres humanos temos muita dificuldade em ter empatia com algo que não entendemos.

Com isto em mente é importante percebemos que podemos lutar contra o suicídio. Tal qual é mostrado na balança é necessário, para mim, duas coisas: 1) Tentar diminuir nossa dor (ou basicamente lidar com o que está gerando esta dor). 2) Aumentar a nossa capacidade de gerenciamento das nossas emoções (ou seja, adquirir mais maturidade emocional, obter ajuda e se apoiar nos outros -- amigos, família, ajuda profissional).

Pense sobre isto

Com tudo isto dito, eu gostaria de pedir que vocês pensassem sobre algumas coisas. São coisas que ao longo do tempo eu descobri sobre mim mesmo e que eu gostaria de compartilhar com vocês.

Você pode sobreviver a isto!

 Muitas pessoas atravessam esta mesma dificuldade, dos sentimentos e pensamentos suicidas, todos dias. Elas conseguem, cada um do seu jeito, atravessar estes períodos. Às vezes de maneiras melhores, às vezes de maneiras piores. Ainda assim elas se mantém vivas. Logo, você não está sozinho e você também pode sobreviver a isto. Talvez este conhecimento lhe ajude a suportar este momento difícil. Pense que suicídio é uma solução permanente para um problema temporário.

Dê um tempo para si mesmo!

 Uma das coisas que eu aprendi, enquanto procurava na internet sobre suicídio, é o conceito de esperar um tempo antes de fazer algo. Seja um dia, alguns dias ou uma semana. Para mim o tempo que mais funciona são 3 dias. Eu digo a mim mesmo: "Ok, espere 3 dias antes de fazer algo contra si mesmo.". Este tempo me ajuda a parar e conseguir respirar. Saber que eu não tenho que obedecer meus pensamentos suicidas durante este período de tempo é ótimo.

De alguma maneira esta separação entre o pensamento suicida e a ação suicida é benéfico. Quando estes pensamentos, e sentimentos, aparecem é muito fácil cair em um desespero e ansiedade que me levariam a tentar algo imediatamente. Ao conscientemente separar o pensamento da ação minha cabeça tem um tempo para esfriar e pensar bem sobre tudo isso.

Quase sempre eu chego no final desse período não mais querendo me matar. Posso ainda me sentir em dor, em depressão, mas elas são menores e mais gerenciáveis. Não estão mais tão "a flor da pele" quanto antes. Minha cabeça não está mais vendo o mundo de uma maneira distorcida. Isto me ajuda a me manter saudável mentalmente.

Só é possível sentir alívio se você estiver vivo! 

Para mim se matar parece como a única forma de eu parar de sentir dor. De sentir alívio de tudo que eu estou passando. Alívio no entanto é um sentimento e a única maneira de sentir algo no entanto é estando vivo. Não é possível sentir alívio, ou melhor, sentir nada, se estando morto. Logo este alívio que você pode estar desejando só é obtido se você se manter por aqui, vivo.

Algumas pessoas podem nunca te entender

Eu sei como é complicado falar sobre pensamentos suicidas com as outras pessoas. Já ouvi que eu estou "simplesmente exagerando", ou que "isto é frescura!", ou que "isto não é motivo pelo qual você deva se sentir triste". Muito dificilmente uma pessoa irá ter a capacidade de não reagir de uma maneira ruim ou acabar falando alguma besteira que piora o seu estado de espírito.

No entanto é importante lembrar de que isto é baseado na ignorância e medo destas pessoas. Como eu disse antes, a maior parte destas pessoas nunca esteve no mesmo lugar que você está agora. Elas não conseguem entender como alguém pode chegar ao ponto de querer acabar com a própria vida. Isto acaba causando uma falta de empatia por parte deles e no, não intencional, agravamento da tua situação.

Ainda assim existem pessoas que podem te ajudar. Pessoas que irão te escutar e tentar entender os teus problemas, que irão prover um ombro amigo e conselhos para te ajudar a não se matar. Eu já fiz uso de alguns serviços assim e fico muito feliz em dizer que isto ajuda. Eu sei que dá medo ligar para um estranho e falar sobre seus sentimentos mas às vezes isto é justamente o que facilita falar sobre estas coisas.

Aqui no Brasil a gente pode contar com o trabalho excelente do CVV - Centro de Valorização da Vida. Eles tem um número, nacional, que você pode ligar: o 141. Lá você vai ser atendido por um voluntário que teve treinamento para ajudar pessoas como nós, que estão passando por um momento difícil e podem necessitar de um apoio.

Vivendo após o período de sobrevivência!

Sobreviver estes períodos suicidas é algo muito complicado, traumático. Eu sempre me sinto exausto após estes períodos porque eu sei que gasto muito energia tentando me manter vivo. Sempre que passo por um período assim eu converso com a minha terapeuta. Assim como eu converso com ela enquanto estou passando por isso.

Falar sobre como foi esse período, o que eu senti e o que me levou a ele me ajudam e muito. Ter essa ciência dos "gatilhos" que podem me levar a isso me ajudam a me manter atento sobre possíveis futuras ocorrências disto. Também me ajuda muito poder falar com alguém que me escuta, sem julgar, sobre como foi passar por isso. Esses desabafos ajudam a gerenciar os efeitos do trauma e também me ajudam a me preparar para o futuro.

Se você puder contar com essa ajuda profissional eu recomendo. Acho que terapia tem muito a agregar nas vidas das pessoas, especialmente nestes períodos onde você precisa de um apoio.


No final de tudo


Saiba que você não está sozinho. Saiba que existem pessoas que mesmo se ter te conhecido querem que você se mantenho vivo. Que ao encontrar páginas como essa estas pessoas quiseram repassar um pouco de como elas se sentem na esperança de que você consiga lidar melhor com os seus próprios sentimentos.

Saiba também que é possível lidar com isto que você está sentindo. Não é fácil mas é possível. Talvez algumas das coisas que foi escrito aqui lhe ajude. Acho importante dizer que não existe uma regra para lidar com isto, cada pessoa acaba desenvolvendo sua maneira de enfrentar isto. Esta é a minha maneira, adaptada a partir de várias outras maneiras que eu encontrei pesquisando na Internet.

Mais importante, espero que ao final disto você se sinta mais confiante de pedir ajuda, seja de alguém na sua vida ou anonimamente através do CVV. Se este post ao menos conseguir isto já é uma vitória.

Estamos aqui, neste mundo, juntos. Por favor, fique nele por mais um tempo ok?







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